Universidade Federal da Bahia


Curso de Pós-Graduação em Geologia

Dissertação de Mestrado


Kikuchi, Ruy K. P. (1994)

Geomorfologia, estratigrafia e sedimentologia do Atol das Rocas (Rebio/Ibama/RN), Atlântico Sul Ocidental Equatorial.
Data de Aprovação: 02.12.1994
Banca Examinadora: Dra. Zelinda M.A.N. Leão (Orientadora), Dr. C.B. Castro, Dr. José Maria L. Dominguez.
RESUMO O Atol das Rocas é o único atol no Oceano Atlântico Sul Ocidental, e é a primeira unidade de conservação marinha criada no Brasil. Ele está localizado a 144 milhas náuticas (cerca de 260 km) a E-NE da cidade de Natal, no Rio Grande do Norte, na costa nordeste do Brasil.

Estudos realizados com o uso de imagens de satélite, associados aos dados obtidos através de perfilagens sísmicas e de testemunhagem contínua da estrutura recifal, assim como datações radiométricas de fragmentos de corais e de conchas de moluscos, e análises sedimentológicas do sedimento inter e peri-recifal, permitiram que se definisse as características morfológicas, estruturais e sedimentológicas do atol e seu entorno, e se formulasse uma proposta para evolução geológica do recife.

O Atol das Rocas tem a forma de uma elipse quase circular, com uma área interna de 5,5 km2. O seu eixo maior (E-W) tem aproximadamente 3,7 km de comprimento, e o menor (N-S) tem cerca de 2,5 km. Conquanto suas dimensões pequenas e a ausência de uma laguna profunda tenham servido de argumento para que Rocas não fosse considerado um atol verdadeiro, sua morfologia atual apresenta várias características que são encontradas nos atóis das regiões caribenha e indo-pacífica, destacando-se entre elas: (i) a presença da laguna rasa e das ilhas arenosas no lado a sotavento do recife, que são características dos atóis do Caribe e (ii) a existência de uma crista algálica na borda recifal, o que é uma particularidade dos atóis indo-pacíficos e (iii) a maior extensão do anel recifal no lado a barlavento do atol, que é uma característica comum aos dois tipos de atóis. A feição “spur-and-roove” no Atol das Rocas lhe é peculiar, pois ela ocorre no lado a sotavento, e não a barlavento, como em outros recifes. A frente recifal a barlavento é uma encosta verticalizada com um depósito cascalhoso na sua base. O restante da superfície do topo do monte submarino é recoberta por sedimento arenoso e pequenas colunas recifais.

A estrutura rochosa do recife é formada por três estratos: (i) um mais superficial, com cerca de 12m de espessura e de idade holocênica, é composto, predominantemente, por algas coralinas incrustantes, como acontece com todos os recifes no Brasil, e, secundariamente, por incrustações de gastrópodes vermetídeos e do foraminífero Homotrema rubrum, e pelos corais Siderastrea stellata, Favia gravida e Montastrea cavernosa; (ii) um segundo estrato, sotoposto ao anterior, é formado por rochas que apresentam uma velocidade sísmica de 2,46 m x ms-1, que é similar àquelas observadas em carbonatos recifais cimentados do Pleistoceno; e (iii) um terceiro estrato formado por rochas com velocidade sísmica superior a 4,5 m x ms-1, da mesma ordem de grandeza das velocidades observadas em rochas ígneas basálticas ou rochas com densidade equivalente.

As idades radiométricas de esqueletos de corais obtidas do estrato holocênico indicam que ao Atol das Rocas se implantou entre aproximadamente 6,5 e 5,5 ka AP, sobre uma provável superfície cárstica de idade pleistocênica. O recife cresceu acompanhando a subida do nível do mar com uma taxa média de 2,3 mm/ano, equivalente à taxa de crescimento de outros recifes que apresentam estrutura com composição similar. A profundidade do carbonato recifal que constitui o substrato do atol atual varia entre 7,5 e 11 m, e sua espessura varia de 25 a 35 m. Este carbonato recifal instalou-se sobre rochas basálticas que, por correlação com as rochas encontradas no Arquipélago de Fernando de Noronha, constituem o embasamento vulcânico que muito provavelmente se formou durante o período Terciário.

Os dados dos parâmetros texturais do sedimento inter e peri-recifal indicam a presença de duas fácies sedimentares distintas: (i) uma externa formada, predominantemente, por uma areia grossa a média moderadamente bem selecionada, depositada na frente recifal e no fundo oceânico adjacente, e (ii) uma interna constituída de uma areia grossa, pobremente selecionada, que foi acumulada nas zonas do platô e da laguna. A composição do sedimento, contudo, não reflete esta subdivisão de fácies. De um modo geral, o sedimento é predominantemente constituído de restos de esqueleto de algas coralinas, testas de foraminíferos e fragmentos de conchas de moluscos. Estes componentes podem atingir até cerca de 97% do total das partículas constituintes das amostras analisadas. As variações observadas no teor desses componentes estão relacionadas, sobretudo, à proximidade da sua fonte. Assim, com relação aos fragmentos de algas coralinas, seu teor cresce nas proximidades das estruturas rochosas recifais, enquanto que as percentagens de testas de foraminíferos aumentam nas zonas recifais que se mantêm constantemente submersas, como por exemplo a laguna recifal e o fundo oceânico adjacente. Pequenas variações sazonais existem com relação aos parâmetros texturais e a composição do sedimento e elas são, muito provavelmente, uma resposta ao equilíbrio entre a energia hidrodinâmica da ação da sondas (variação na intensidade dos ventos) e o ciclo biológico dos organismos recifais, particularmente o período de reprodução e a taxa de mortalidade dos foraminíferos bentônicos.

ABSTRACT The Atol das Rocas, the unique atoll in the Southwestern Atlantic, is the first Brazilian marine area to be protected by law. This Biological Reserve comprises the reef and the surface of the top of the seamount where it rises from, to depths of 1000 m. It is located 144 nautical miles from the city of Natal, NE Brazil.

The results obtained through the mapping of the reef using Landsat/TM images, seismic refraction investigation of the reef substrate, a shallow drilling core of the Holocene sequence of the reef, radiocarbon dating of coral skeletons, and grain size and constituent particle composition analysis of sediments sampled twice a year (end of summer and end of winter), allow us to establish the morphological, structural and sedimentological characteristics of the atoll, as well as to propose a theory for its geological evolution.

The reef has the shape of an ellipsoid, with an internal area of approximately 5.5 km2; its largest axis (E-W) is approximately 3.7 km long, and the shortest (N-S) is 2.5 km. Because of its minute size and the absence of a deep lagoon, the Atol das Rocas was not considered a true atoll. However, ist morphology presents the following similarities with the Indo-Pacific and the Caribbean atoll types: (i) the presence of an extremely shallow lagoon and the location of sand cays on the leeward side of the reef which are distinctive characteristics of the Caribbean atolls; (ii) the presence of an algal ridge which is an important feature of Indo-pacific reefs, and (iii) the greater breadth of the reef proper on its windward side which is common in both types of atolls.

Contrasting with most of the atoll reef models, in Rocas the spur-and-groove system developed only in the lee side of the reef. The windward wall is an abrupt escarpment at its base. The remaining surface of the seamount top is covered by carbonate sand and small patch reefs.

The seismic profiles revealed the presence of three rock stata: (i) a Holocene reef sequence mostly composed of coralline algae, like all other reefs in Brazil, although the coral species Siderastrea stellata, Favia gravida and Montastrea cavernosa, and, the encrusting foraminifer Homotrema rubrum and vermetid gastropods are also important frame builders; (ii) the second rock sequence underlies the Holocene section. It is characterized by seismic velocities of 2.46 m x ms-1, similar to those observed in other cemented reef carbonates considered of probable Pleistocene age; and (iii) a third rock strata with seismic velocities greater than 4.5 m x ms-1, similar to velocities observed in basalt or equivalent hard rocks.

According to the radiocarbon ages of coral skeletons from the drilled core, the atoll growth must have begin between 6.5 and 5.5 ka BP, above a probable karstic surface of Pleistocene age, with an accretion rate of 2.3 mm/y, similar to those rates measured in reefs with the same composition. The reef substrate, a carbonate rock, is at depths between 7.5 and 11m, and has a thickness that varie form 25 to 35m. It accumulated above volcanic rocks that, compared with similar rocks from the Fernando de Noronha Archipelago, they should have formed during the Tertiary.

Data from the textural parameters show two distinctive sedimentary facies: (i) an outer reef facies (reef front and seamount top), which sediment is moderately well selected coarse to medium sand and (ii) an inner reef facies (reef flat and lagoon) characterized by poorly selected coarse to very coarse sand. The variations in the constituent particle composition of the sediment samples (composed primarily of coralline algae fragments, foraminifera tests and mollusk debris, that adds up to 97% of the particles), is driven mainly by the proximity to the reef proper or by environmental parameters, such as current and wave energy and exposure to atmosphere. Thus, the coralline algae fragments are more frequent in the proximity of the reef structure (their main source) while the foraminifera tests are more common in the zones which are constantly submerged, as form example the lagoon and the adjacent ocean floor. Both textural and compositional parameters of the sediment show some seasonal variations between the end of summer and the end of winter, and they seem to be related to variation of the energy of wind induced waves, as well as the biology of the reef organisms, particularly the reproductive cycle and the mortality rate of the benthonic foraminifera.